O MUNDO ANIMAL…

O MUNDO ANIMAL…

Pedro Santos

O que vou narrar agora, vocês não precisam ler…ainda mais que no decorrer deste texto o que nos espera não é nada agradável. São cenas fortes de um tempo distante que a muitos parecerão inacreditáveis. Tratem logo de procurar nos dicionários o significado de “zoofilia” e “necrofilia”, tais informações lhes dirão se devem ou não seguir em frente na leitura dos fatos que irei contar. Caso insistam e se deixem dominar pela inata curiosidade humana, não digam que foi por falta de aviso. Muito bem…se seus olhos ainda prosseguem no encalço deste meu ajuntamento de letras, é porque querem saber mesmo daquilo que devíamos manter trancado sob sete chaves. Como o “Aurélio” ou o “Houaiss” já devem ter-lhes esclarecido o sentido dos dois termos, trago à baila, primeiramente, os episódios concernentes aos adeptos da “zoofilia”, narrando hipotéticas histórias de pessoas dadas a relacionamento sexual com animais. Sintam-se à vontade para voltar atrás e me abandonarem esta minha tentativa de revelar a todos os mais recônditos e íntimos segredos de personagens aparentemente normais… eu entenderei e seguirei sem mágoas nesta narrativa repleta de surpresas. Deixo claro que tais comportamentos fora do comum nunca me seduziram, mas as notícias de outros que a eles recorriam circulavam naturalmente nos idos de minha adolescência. Por conveniência lógica, ocultarei ou trocarei nomes desses enamorados zoófilos, alguns até de não tão distante convivência. Lembro-me de um fato que teria se dado no bairro da Piedade, aqui em Itaúna, envolvendo uma égua charreteira e um vizinho de seu proprietário. O dono do animal, depois de usá-la diariamente fazendo fretes com sua carroça, a soltava pelas ruas para que fosse pastar em algum dos tantos matagais pródigos de capim. No dia seguinte, saía com o amanhecer para buscá-la onde estivesse, para mais uma rotina de serviços. Numa dessas, encontrou-se com um conhecido pelo caminho, que lhe pediu fogo para acender um cigarro e que lhe agradeceu, com um sorriso babento no canto da boca, retribuindo-lhe com um segredinho malévolo: “Brigado seu Antoim…” “Num há de quê…” “Uai, ô seu Antoim… quer dizer que o senhor agora tem um sócio pra Maiada!?” “Sócio…com minha égua? Não… eu trabaio é sozinho!” O fumante futriqueiro deu uma tragada…fechando os olhos numa expressão prazerosa…soprando pro ar um canudo de fumaça como se fosse uma chaminé: “Ô seu Antoim…eu tô falando doutra coisa…é caso de amor…” Disse isso, já esperando que o velho carroceiro caísse no entendimento de sua revelação cifrada. “Ô rapazinho…fala igual gente…que joça é essa de…amor…de sócio de égua…? Desembucha…que eu tenho que preprará minha charrete!” “Tá bão seu Antoim…vou desenhar pro senhor…tem um sujeito pegando sua égua, é isso!” “Deixa de conversa sô…se tivesse arguém montando e passeando nela eu ia sabê… todo mundo sabe que ela minha…me contavam logo!” “Ô seu Antoim…eu tô falando outra coisa…tem um sujeito comendo a sua égua…enrabando eeela! Entendeu agora? Fazendo amor com ela!…” Finalizou assim sua revelação banhando suas palavras numa risada debochada. O seu Antônio ficou de boca aberta, de onde saiu um monte de perguntas: ”O quê que cê tá falano? Tem um fidaputa… comendo o cu da Maiada? Cê só pode tá brincano… minha eguinha servino de guenga? Me fala o nome desse infeliiiz…se ocê num tá mentino!” “Ô seu Antoim…o senhor é home bão e eu num ia mentir pro senhor…e eu vô falar…aí o senhor faz o que quisé…eu também num tolerava isso não…É Zé do Chiquinho! Aquele malandrão que mora ali na rua de cima…ao lado da casa da dona Merinda!” Seu Antônio nem disse mais nada… e saiu apressado com o seu cabresto nas costas, subindo pro lado da tal rua, como se fosse um marido traído. O delator, enquanto apagava o seu cigarrinho com a ponta da botina, ficou olhando o velho indo morro acima, que gesticulava e parecia vociferar uma coleção de palavrões, que certamente repetiria na cara do filho do seu Chiquinho. “Ô de casa!”, bradava e repetia o carroceiro diante do número 45 da Rua Rio Branco, mais conhecida como “rua de cima”. Veio lá de dentro uma senhora, bem magra, com seus cabelos brancos se contrastando com sua negritude: “Oi seu Antoim…tudo bão? Vamo intrá!” “Não…não…dona Rosalina…tô querendo fala é com seu fio…o Zé…ele taí?” “Tá não…seu Antoim… Senhor tá precisano dele? É algum serviço?” “Serviço?…sim…ele…já fez o serviço!” “Ah… o senhor tá querendo é acertá com ele?!” “É…dona Rosalina…quero fazer um acerto…e tem que ser com ele memo…” “Ah, tá… uai, ele saiu…deve tá por aí… no meio desses mato… lá pros lado do Buracão…nunca vi gosta tanto de pegá passarinho!” “Seeeii…gosta memo… do buracão… e de pegá tamém outras coisa…” Seu Antônio foi mal se despedindo e saindo… deixando a mãe do “Zé do Chiquinho” com uma interrogação nos olhos… e se embrenhou no primeiro matagal que surgiu em sua frente, rumo ao tal “Buracão”, uma pirambeira com cara de cânion. Enquanto não encontrasse o sujeito, não teria sossego! Nessa sua busca, acabou achando primeiro a sua égua, que pastava por ali, parecendo satisfeita como nunca. Colocou-lhe o cabresto e a foi puxando…pensativo. Quando lá adiante…um vulto, que parecia uma miragem, vinha em sua direção. “Não é possível…Deus é bão demais!…” Era o Zé do Chiquinho… com uma carinha boa… foi chegando: “Ô seu Antoim… tudo bão?” “Eu tô…mas vai ficá mió…” “Êta eguinha bonita essa do senhor, heim seu Antoim?!” “É…eu sei que cê acha, seu fio de uma égua!” O velho disse isso e já partiu pra cima do rapaz com um chicote na mão, não dando-lhe tempo de reação, jogando-o no chão com os olhos arregalados: ”Quê, que isso seu Antoim?! Tá ficando doido?” “ Tôôô…e vou ficá mais…seu “cumedô de égua dos outro!” “Cu…cu…cumedô? Eu?!” “Num neeega… seu pau de bosta, queu te enfio esse cabo de reio no rabo!” “Tá bão seu Antoim…mas foi só uma vez! Eu nem gosto disso!” “Num gosta?! Fica sabeno que quem me falô, garante que o negócio seu é caso de amor!” “Ô seu Antoim…eu juro que num vou fazê isso mais, não! Pela alma da minha mãe!” “Que alma da sua mãe…ela tá vivinha na sua casa!” “Da…da…minha vó, então! Num mexo com a Maiada mais…um raio pode cair na minha cabeça, se eu mexê de novo!” Seu Antônio via um pouco de sinceridade naquele miserável desocupado. “Tá bão… vô acreditá…mas vou ficá de olho agora…cuidaaado, heim!?” “Tá…tá…seu Antoim…”, dizia assim já querendo se erguer. “Pe…peraí…num acabô nããoo…cê acha que vai ficá por isso memo?! Ã…ã!…Me passa 10 real aí…” “10 real?…seu Antoim? Num tenho isso, não!” “ Num tem o quê…deixa eu vê se num tem?!” E já foi enfiando a mão bolso da bermuda rasgada do Zé do Chiquinho…retirando de lá uma mão de moedas. “Ô seu Antoim…esse dinheiro é da mãe… me deu pra pagar a padaria!” “Mentiroooso! Aposto que cê pegou isso foi lá na caixinha da igreja!” “ Mas pra quê que o senhor qué isso?” “ Pra quê?…Cê acha que é só ficá no bem-bão com a minha eguinha?…Essas pratinha…que num dá nem cinco conto…é pra ajudá a pagá o milho da Maiada, uai! He…he! É tipo uma pensão alimentiça!” Não sei dizer se o Zé cumpriu sua promessa de não aliciar mais a égua do seu Antônio, nem se ela ficou com saudades dele. Quem sabe?! A gente ouvia outros casos assim, naqueles tempos vadios. Tem um que talvez só sobreviva mais no terreno da minha desconfiança. Por mais de 50 anos minha mãe comprou ovos de um vizinho nosso… toda semana. Era um rapaz madurão, criado na barra da saia materna, sem nunca ter conhecido uma mulher nas condições mais íntimas, era o que todo mundo apostava. Falava com um sotaque arrastado, gemendo as palavras, num “idioma” que foi batizado de “batatês” por um professor que morou no “Povoado de Batatas”, onde quase todo mundo falava daquele jeito. Mas parecia feliz, sempre sorridente, mesmo sem nunca ter sido visto com uma namorada. Sua mãe o preservava como um casto na terra dos anjos. Um dia, olhando filosoficamente o cesto de ovos que ele deixara na casa de minha mãe, pensei: “Será que algum destes ovos seria filho dele?” Assim eu meditava, ao lembrar-me de certas histórias que davam conta de que muitos meninos da roça, para desafogar seu libido caipira reprimido, valiam-se de galinhas e outras aves maiores, num relacionamento nefasto que, muitas vezes, levavam a óbito algumas daquelas penosas assediadas. Até hoje essas minhas conjecturas se avivam quando dou de cara com ele em suas entregas à minha mãe. Talvez um dia, isso se comprove. E do segundo termo, “Necrofilia”, que nomina a conduta de pessoas que se comprazem em ter relações sexuais com cadáveres, tive mais informações ficcionais do que fatos (mais em revistas e filmes trash…). E o que tenho a narrar, não tem graça nenhuma. No meu convívio, o exemplo mais próximo que tive ouvi de um falecido advogado aqui da minha terra, ao revelar um comportamento seu, que eu chamaria de “preliminares necrófilas”, se ele tivesse levado a cabo suas intenções embutidas. Contou, não diretamente a mim, mas pude ouvi-lo junto de outros (e falava com certo êxtase), do dia em que esteve sozinho diante do corpo de uma jovem morta, nua em um necrotério… não resistindo… beijando efusivamente seus seios frios. Quando, raramente, me lembro dele, apenas essa tétrica memória me aflora. Tais atitudes, ainda que pareçam inimagináveis aos olhos mais puros, não estariam extintas dos bastidores comportamentais da raça humana. Não… não duvidem. É tudo verdade.

(Mais um pedaço de minhas anotações pandêmicas, “PUXANDO PELA MEMÓRIA”, que vai reunindo o que me lembro de mim mesmo e dos meus.)

@opedrosantosde

 

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