O 18º COMBATENTE DO FORTE DE COPACABANA.

O 18º COMBATENTE DO FORTE DE COPACABANA.

Antônio Pimentel

A Revolta dos 18 do Forte de Copacabana é episódio famoso da história do Brasil. É um marco da presença e interferência dos militares na cena política nacional. Momento expressivo e cruento do Movimento Tenentista, ações político-militares da jovem oficialidade do Exército, na década de 1920. Revolta contra as oligarquias agrárias que dominavam o país: poder econômico, jogo político viciado, desigualdades sociais agudas.

A intenção era a eclosão de um movimento amplo, com a adesão de várias unidades do Exército. O levante estava previsto para o dia 05 de julho de 1922. A maioria desistiu. Só os militares do Forte de Copacabana se amotinaram. Cercados por 3000 militares leais ao governo, a maior parte dos rebelados desistiu da empreitada. 17 persistiram e marcharam para o confronto com a tropa legalista reunida no Leme. No caminho, um civil se juntou aos militares, formando os 18 do Forte. No confronto com as tropas governamentais, 16 morreram. Sobreviveram os jovens oficiais Siqueira Campos e Eduardo Gomes, feridos no tiroteio. Foi o fim do levante.

A Revolta dos 18 do Forte tem muitas análises e repercussões na história do Brasil. No entanto, o que me moveu a escrever foi um único participante do episódio: Octavio Corrêa, o civil que se juntou aos militares na Avenida Atlântica. Empunhando um fuzil, o décimo oitavo do Forte marchou para a morte. Fotos da época mostram os militares fardados, amarrotados, e um cidadão de terno, gravata, chapéu parecido com o de Santos Dumont. Um senhor elegante, empertigado, com um fuzil na mão. De longe, nas fotos precárias da época, parece empunhar um guarda-chuva. Historiadores confirmam que era um fuzil. Quem foi aquele homem? O que o moveu para uma empreitada visivelmente sem possibilidade de sucesso?

Pesquiso e descubro o básico. Octavio Corrêa morreu novo: 36 anos. Era gaúcho, filho de um rico latifundiário. Na estância da família, domou potros e tocou violão. Era inteligente, inquieto, sem modos. Queria estudar Direito. Na última década de sua vida, viajou pela Europa e se fixou em Paris. Vida de boêmio nas noites parisienses, convivendo com poetas, artistas e pintores no Quartier Latin. Voltou ao Brasil e não há notícias sobre sua vida por aqui. Podia ter seguido em paz, viajando e aproveitando seus dias. Tomou um rumo inusitado.

O certo é que aquela luta não era de Octavio Corrêa. Por algum motivo – indignação, impulso cívico, revolta, razão ou a falta dela – ele resolveu seguir com os militares. Dizem que Hegel, o grande filósofo alemão, ao ver Napoleão cavalgando na cidade de Jena, depois de derrotar o exército prussiano, comentou: “Napoleão é o espírito do mundo a cavalo.” Ou teria exclamado: “Eis a razão a cavalo!” Há quem diga que Hegel falou: “Hoje eu vi a História a cavalo.” Hegel apostava na racionalidade humana e na força dos grandes heróis. A História tem, com certeza, outros dinamismos e atores, mas a figura do herói ou do indivíduo destacado nos processos históricos é sempre intrigante.

Sem intenção de erudição, que não tenho, viajo nas possíveis falas hegelianas. Octavio Corrêa, mesmo com motivações desconhecidas, viu a História marchar diante dos seus olhos e não quis ficar parado no passeio. Não se contentou em ver a banda passar. Usando uma expressão popular, não quis perder o bonde da história. Embarcou numa canoa furada, mas seguiu sua razão ou seus impulsos. A foto que ilustra esta crônica mostra um grupo sem qualquer chance de vitória. Octavio tem posição de destaque. O que passou na cabeça daquele homem? Como ele foi parar naquela marcha sem destino? Buscava a glória de fazer História, como o ensandecido Aguirre, aquele tomado pela cólera dos deuses? Estava cansado de uma vida de fruições? Queria romper com sua condição de pacato cidadão? Abatido a tiros, ele levou as respostas para o túmulo.

24/09/23

@amtoniopimentelbh

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