A Chegada

A Chegada

Victor Fernando

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Dedico essa obra a minha melhor amiga, a Marxista

-Já está vindo? – Perguntou João, sentado na cadeira e cofiando o bigode.

-Ainda não estou vendo nada. – Respondeu Fernando, o irmão de João.

      Eles estavam ansiosos porque o seu sobrinho estava voltando da cidade. Tinha ido a São Paulo estudar biologia. Há cinco se correspondiam somente através de cartas, porque no vilarejo em que os irmãos moravam não havia internet. Roberto, o seu sobrinho, era filho do irmão mais velho de uma família que contava com cinco meninos. Sobraram apenas três dessas crianças: os dois que foram apresentados e Antônio.

-Mano! – Gritou Fernando, virando-se para o velho e apontando para a estrada. – Lá está vindo carro.

-Acalme-se. – Disse João calmamente, ainda cofiando os bigodes. – Pode ser qualquer um.

-Não, meu irmão, é ele! Eu sei que é.

      O carro foi chegando mais perto até que parou em frente àquela casa velha e grande, que fica na entrada de um povoado com menos de cinquenta pessoas. Saiu do carro um garoto com olhos vermelhos de chorar, uma camiseta preta e uma sobreposição vermelha. As calças, também pretas, estavam amarrotadas de tanto serem apalpadas pelas mãos ansiosas de Roberto. Os dois irmãos olhavam espantados aquele jovem que descera do carro. Não parecia mais a criança que saíra de casa rumo à cidade grande. Agora estava com ares de pessoa urbana. Além das roupas, tinha também às mãos um celular da última geração; os seus cabelos, antes com corte baixo, social, agora estava longo e pintado algumas mechas. Sem falar, é claro, das tatuagens que o rapaz tinha pelos braços, cinco, no total. Os seus tios não prestaram atenção aos detalhes, pois o mais importante era teu seu sobrinho ali com eles. Abraçaram-se e mataram essa danada da saudade que tanto apertava. Fernando apertou-lhe a bochecha e dizia como estava feliz por vê-lo novamente.

-Nunca mais saia de perto! – Dizia entre choros.

-Deixe o menino, Fernando! Não o aborreça.

-Mano, deixe-me! Faz cinco anos que não via esse rosto.

João virou-se para Roberto e pediu desculpas pelo seu irmão: “só falava de você nos últimos meses.”

-Não se preocupe, isso não me aborrece. Porém, ficarei muitíssimo aborrecido se não comer algo, a viagem foi longa e estou com muita fome.

-Mano, deixe ele se acomodar no seu quarto e vamos pôr comida na frente desse garoto. – João segurou nos ombros de Fernando e o levou para dentro. – Você precisa se acalmar, ele não é mais uma criança, isso pode deixá-lo irritado.

-Tio João, em que quarto eu vou ficar?

-Desculpe, esqueci de lhe mostrar. Fernando, prepare os pratos enquanto instalo Roberto.

O quarto era pequeno e apertado, porém, aconchegante e bem arrumado. Tinha as parece rachadas e o teto deixava entrar muitas frestas de luz. Tinha uma janelinha na parece oposta onde ficava encostada a cama.

-É pequeno, porém, entenda que estamos em dificuldades financeiras agora e não temos condições de arrumar esses detalhes. – Disse João, com uma voz triste e tocando na parece, passando os dedos pelas fendas.

-Não se preocupe, está ótimo. Estou animado para que me apresente a vila, estou com saudades de Marcela. Como passa?

-Logo após você viajar, dois meses depois, ela foi para o Rio de Janeiro. Ainda está lá.

Roberto e Marcela eram melhores amigos e viviam juntos, às vezes não se separavam nem para comer. De todas as pessoas, sem dúvida Marcela era a única de quem tinha mais saudades. Foi um suplício separar-se dela. No dia da partida para São Paulo, os dois haviam brigado: ela não queria que ele fosse e ele não queria ficar longe dela. Arquitetaram até uma fuga juntos. Pensaram em muitos planos, porém, em todos alguns empecilho frustrava o empreendimento dos dois. Não tinha outra escolha a não ser deixar as coisas como estavam acontecendo, pois qualquer movimento contrário poderia dificultar a vida de ambos. E foi em uma noite chuvosa, com a angústia a apertar a garganta de todos e com as lágrimas a rolarem pelos rostos, que Roberto partiu rumo a São Paulo.

-Acomode-se e troque de roupas. – Disse João, reanimando-se. – Vou lhe apresentar a casa e a vila.
continua……..

@inch.bon-vivant

 

 

 

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