O Diabo Das Províncias

O Diabo Das Províncias

Geórgia Alves

 

“O diabo faz ninho no olho do pássaro, na casca pintada do novo, na garra da besta, no rastro de penas, no redemoinho do rio.”

O diabo das províncias de Juan Cárdenas.

Imagina. Imagina se por algum trágico desmotivo,  por puro desejo do diabo, a lua, de repente,  desaparecesse. Desaparecesse da órbita terrestre. Despedaçada por inexplicável colisão com um desses cometas que perfazem trajetórias, errantes em nossas cabeças mortais, anunciando sempre um novo fim do mundo. Ainda ignorantes da vida e suas regras mais invisíveis, como seríamos nós capazes de encontrar um antídoto? Ou para usar linguagem que cabe no caso do invisível inimigo, um manejo integrado para salvar a plantação? De algodão? Do diabo enredado aos dias em que vivemos, impressiona o modo como Juan Cárdenas entrega sua trama. Mais ainda. A verde poética. Os olhos e ouvidos treinados. Tradutor, crítico e curadoras de arte. Pode-se dizer que a escrita de Cárdenas é um “capricho da Natureza”. Talvez tenha se ocupado de entender tão bem sobre abacates, quanto a vida deste biólogo – é apenas assim identificado seu personagem,  pelo papel no mundo – e a própria língua. O suficiente para conduzir a narrativa de maneira indecorosa de tão refinada e, no melhor sentido, mãos que cínica. Clínica. Como não perceber que seu modo é uma entrega em ternura a esta mesma língua que questiona e ama, ao perceber que “não seria”, talvez, “adaptada a sobreviver”, tanto quanto “um animal torto”, tão exótico que torna até mais simples compreender uma expressão estrangeira, porque universal. “Talvez o papel de minha escrita seja entregar, a contrapeso, uma imagem analógica”, diz o autor. E suaviza nossa existência dia te do impasse que vive o biólogo e o díler diante da palavra : “bróster”. Naturalmente há um riso no meio. Alguma coisa induz a um riso, pois inexplicavelmente tornamo-nos, os mais próximos – na América Latina? – o máximo de nossas incompreensões. Quem é o díler? A amizade que resta ao biólogo nesta volta à província, à casa da mãe.  E do irmão mais novo que era o mais admirado. E, na opinião da mãe,  quem deveria ter direito à sobrevivência entre os dois. O díler é alguém que não sabe esconder os olhos ternos diante da beleza,  sobretudo diante de uma caixa atrás de um balcão. Talvez, sem perceber,  tenha encontrado uma chave. “O olho preparado para caçar a imagem fugaz das cores.”. A irrestrita atração para a Literatura deste colombiano,  cujo país pode mesmo ser o mais belo em todo o mundo, diante dosnolhos todos.. inclusive dos olhos espremidos vindo de algum lugar do oriente.
É preciso habitar por mais tempo que o predito pelo diabo das províncias e esperar pelo encontro  -ou reencontro? – com a namorada do irmão. Pois quando em o diabo das províncias cai a noite no canavial é preciso olhar com funda ternura o tempo. Não apenas o futuro. O que havemos de entregar no presente. Alguns segundos de olhos colados à roupa azul-metálica e os meus bem são capazes de perceber mais que os apontamentos na noite mais escura. Que são olhos que atravessama compaixão à figura desaparecida da lua. De modo que o díler possa experimentar uma temporada inteira de banhos de mar na noite mais sem luz, no completo escuro. E o biólogo? Bem,ele possa mesmo escolher as roupas que lhe servem. O espaço que lhe cabe no mundo.
Livrarias Travessa
Livro de autor e convidado pela Flip 2024
Tradução Mqrina Waquil
DBA Editora
São Paulo
@georgia.alves1
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