Imponderabilidade

Raul Tartarotti

De quatro patas um corpo fica mais leve pra ser transportado, principalmente quando é preciso levar muito peso, como por exemplo um peso extra cultivado em tempos de peste. A insustentável leveza do ser não explica sobre nosso peso cotidiano, que nos rouba muita energia, e acaba por faltar um tanto pra poder respirar. Diversas dores aqui no chão terreno levam meu pensar pra bem longe do pátio que me circula. Talvez a 86 km de altitude, possa ser um lugar a me aliviar, no mínimo deixar mais leve, já que a imponderabilidade se torna ativa, e sem limites de peso existencial.

Essa semana partiu o primeiro micro-ônibus para a borda do espaço. Inaugurando oficialmente a era do turismo espacial. A mini espaçonave da empresa Virgin Galácia, levou seis humanos, agora considerados viajantes do espaço, pra curtirem nosso planeta azul através de uma janelinha de submarino, e passarem pela experiência da falta de gravidade. Viagem pra poucos aqui de baixo entrarem na fila, porém, a frequência com que nossas dúvidas e dores se empilham no dia a dia, o absurdo da existência fica a mercê de uma desistência fatal momentânea que nos dá vontade de embarcar nessa linha aérea a qualquer preço. Vivemos tempos muito duros, pandêmicos e doídos politicamente.

A viagem se mostra atrativa porquê o saldo terreno, até o momento, pesa a favor do mal, e a temática cada vez mais espinhosa é um lamento de quase morte na praia, por cansaço, ou fraqueza na hora H. Mas luzes no fim do túnel apontam pra quem se mostra esforçado e focado em si, na busca de leveza e demonstração de competência, aqui na terra mesmo. Como a enxadrista brasileira, Júlia Alboredo, 24 anos, com currículo para enfrentar um dos maiores torneios globais de xadrez: a Copa do Mundo feminina na Rússia. Será a primeira brasileira a fazer isso. Os conquistadores falam às vezes de vencer e de superar, mas sempre querem dizer “superar-se”. Além da quebra de tabu, o gesto de Júlia, dá visibilidade ao esporte em um país que nem soube que um jovem brasileiro, Luis Paulo, de 23 anos, venceu em 2020, Magnus Carlsen, o melhor enxadrista do mundo. São talentos escondidos que servem de modelo aos muitos jovens que buscam se firmar em alguma corda familiar ou na busca de oportunidades. Um ressentimento incubado pela falta de coragem, é apenas a tentativa sempre repetida de narcotizar a dor por meio dessa descarga de afeto. Tantas dificuldades talvez caibam somente expostas numa mesa com 12 apóstolos, onde podemos pedir pra rezar um pai-nosso ao final do dia, e costumeiramente costuramos essa oração como abono dos pecados cometidos. Eles são quase como uma lava incandescente escorrendo montanha abaixo, deixando rastro de pedra em fogo. E nada faremos para impedir sua natureza da destruição, apenas contemplar a passagem mortal, nascida naquele vulcão em frenesi de si mesmo.

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