Morte súbita

Eugênia Câmara

Prezados senhores leitores,

Venho através da presente, comunicar com lágrima nos olhos, o falecimento do celular Samsung A20, de propriedade dessa que vos escreve.

Informo que a vítima teve um mal súbito em pleno voo de São Paulo para Paris, partindo, não nas asas de um avião, mas de um vazio tecnológico, às 2:45 da manhã. Não sabemos ainda em qual fuso horário houve o real desencarne, pois esse era o horário que ele acusava.

Para maiores esclarecimentos, evitar mal entendidos e fake News, relatarei os fatos a partir de agora.

Seu desfecho deu-se após quatro anos de vivência. Jovem ainda, mas mal súbito não tem idade. Trabalhava de sol a sol, sem direito a sábados, domingos ou feriados. Também não reclamava nem cobrava hora extra. Talvez se tivesse dado alguns dias de férias, ele tivesse prolongado sua estada em minhas mãos…. mas, como saber?!

Continuando, dentro de seu corpo possuía senhas, segredos, lembranças, conversas (confessáveis ou não) e digitais. Enfim, um serviço secreto. Mesmo sendo portador de todo esse material, permanecia fiel a minha pessoa, sem nunca me trair, nem me denunciar anonimamente.

Mas a vida é incerta e nos pega de surpresa. Nesse momento quase infartei junto, em pleno ar pois minha vida estava em suas mãos, quer dizer em seu mecanismo. Saliento que foi realizado diversos tipos de tentativa para ressuscitá-lo, mas como ele não era Lázaro, não teve jeito a não ser aceitar seu fim.

Desesperada, tive que sobreviver por mais diversas horas, inclusive com conexões e outros voos sem sua presença. Estava às cegas. Mas felizmente sobrevivi, pois nasci no século passado quando ainda não existia celular e a comunicação era feita através da fala, gestos, mímicas e todo tipo de tentativa de contato.

Finalmente, em Malta – para onde dirigia-se com sua dona -, foi devidamente acondicionado dentro da mala para traslado no momento certo, e tive que comprar um outro celular, inferior obviamente, até porque, comprar celular no exterior é caro. Mas não sem antes fazer a devida necropsia, retirando de suas entranhas seu chip e cartão de memória.

Muitos APPs foram perdidos, outros retornaram e alguns teimam em funcionar pela metade, como forma de protesto pela simplicidade do novo modelo.

Mas a vida continua. Aliás, sempre continua. Às vezes mais simples, outras com mais condições, mas sempre em frente.

Espero que tenham gostado dessa forma de contar como meu celular faleceu em pleno ar.

Até a próxima.

@mecalves